ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS BESSA É O PRIMEIRO LIVRO DA COLECÇÃO DE POESIA EM 2024.

Mais do que poesia da experiência, expressão gasta com o uso, estes livros reunidos são «imagens vindas dos dias». Há em Carlos Bessa um sentimento do mundo que conhecemos de Ruy Belo e de outros contemporâneos (o tempo, a morte, o hábito, as «maneiras de dizer adeus»), com observações e recordações umas vezes comovidas, outras indignadas, e a auto‑piedade contrariada por veemências e sarcasmos. A existência confunde‑se aqui com o quotidiano, os empregos, o desajuste, o tédio, em contexto urbano, suburbano, rural ou ilhéu. E essa sensação inquina até a vida doméstica e afectiva. Mas a linguagem é vigorosa, não frouxa ou prosaica, e Bessa não se refugia no «bunker do eu», preferindo o discurso elíptico, o biografismo esquinado. O mal viver activo destes versos manifesta‑se assim na «violência do sim» e na «ternura do não», nas elegias aos mortos ou a «algo em nós [que] morreu», num horror vacui que admite que todo o vazio é preenchido, mesmo que seja por aquilo que se degrada ou desfaz, mesmo que seja pela poesia, «energia gasta em / preservar o inútil».